Câmera 8 #1 – Diário de Bordo

Na sala dos cinegrafistas, há um telefone que toca quando a realidade chama.

Na sala dos cinegrafistas, há um telefone que toca quando a realidade chama. Um acidente de carro, uma lei aprovada, um alagamento ou a falta d’água, um treino de futebol, o aumento do preço do tomate, o frio. 

Fora da sala, nós cinegrafistas nos organizamos de uma forma um pouco desordenada: horários alternados, equipes diversas, equipamentos que passam de mão em mão, o rigor de cumprir a carga horária de trabalho.

 

É claro que isso mudou. As rasuras da realidade não provocam mais o tocar do telefone com a mesma frequência, intensidade e urgência de antes. A reportagem perdeu muito do seu caráter de acaso, dos acidentes, dos desvios provocados. Agora caminhamos numa linha reta e pragmática sobre a qual me equilibro.

Todos nós, profissionais da reportagem, estamos nos reinventando para fazer a cobertura desse período. Acostumados a estar diante de um acontecimento visível e visual, eu e meus colegas cinegrafistas, estamos passando por um novo desafio proposto pelo flagelo. Como é transformar em imagem algo invisível?

As reportagens normalmente tomam como ponto de partida o concreto, as amarguras deixadas pela doença: as filas na Caixa, os hospitais lotados, as entrevistas com especialistas, as ações solidárias… Às vezes, deixamos de lado um pouco da dureza do concreto e produzimos as matérias sentimentais: o medo, a esperança, a dor, a alegria como temas de nossas notícias.

Mas o protagonista, ou antagonista, do presente segue invisível em nossas imagens. Esse desafio pode se desdobrar em novas formas do jornalismo encontrar caminhos contemporâneos e estéticos para lidar com isso que chamo de realidade. A fotografia e o cinema têm muito a ensinar à dureza do jornalismo televisivo: o ritmo, o tempo, os enquadramentos, o ver pelo não.

Perseguindo o desejo de tentar entender a invisibilidade do flagelo e do trabalho técnico do repórter cinematográfico, crei o instagram @giordano_camera_8. Um diário de bordo dessa navegação por mares conturbados, do qual compartilharei neste espaço algumas reflexões sobre meu ofício durante esse tempo. Convido vocês. Em “A peste”, Camus reflete: “Para vencermos a abstração é preciso se tornar um pouco abstrato.”

É uma forma que encontrei de encarar o desafio.

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